quinta-feira, 10 de julho de 2008

Photomaton & Vox


"Mas de tudo isso descobri eu os maneirismos e a figura romântica. Éramos uma nova imitação de Cristo na luciferina versão de alguns radicais, antigos e modernos, para quem a poesia foi uma acção terrorista, uma técnica de operar pelo medo e o sangue. Ingenuidade tão monstruosa como a da mitologia solar que transporta para os mercados as pombas da paz, a terceira pessoa do pacto social - isso: o que a lei espera do amansamento das disposições dramáticas.
É sempre fácil caminhar em cima das águas, mas é impossivel fazê-lo milagrosamente. Tornou-se um número de circo - aquele equilíbrio no arame que mata o apetite de vertigem e nublosa delinquência de uma emotividade suburbana. A última revelação é esta de sermos os produtores inexoráveis e os inevitáveis produtos de uma ironia cuja única dignidade é descender do tormento, um tormento sempre equivocado na sua manifestação sensível. Por isso cada vez mais me devoto ás imobilidades, aos silêncios, aos sonos."


Extraído do livro Photomaton & Vox, escrito por Herberto Helder.

2 comentários:

homemdacal disse...

Uma vénia. Penso que o Herberto Hélder é o maior poeta vivo.

Unknown disse...

O maior não sei mas grande, sem dúvida que é. Agradeço-te o facto de me teres dado a oportunidade de o ler. Abraço amigo.